Antes de publicar as imagens da recente intervenção que fiz na igreja de São José Operário, feitas para celebrar o seu jubileu de ouro, 50 anos da sua fundação, gostaria de partilhar com vocês algumas idéias mentoras do meu trabalho, apresentando minha tradução livre do capítulo V - O Templo - do livro "Teologia della Belleza" de Pavel Evdokimov. Aos poucos darei prosseguimento às outras partes.
1. O desenho divino e a origem celeste do templo
“O templo é o céu terrestre, nos seus espaços celestes Deus
habita e passeia.” Estas palavras do Patriarca Germano¹ nos fazem ver por
dentro o significado vertiginoso do templo cristão. Os Bizantinos trabalharam
sobre o espaço como lugar e morada de Deus; o seu problema arquitetônico
procurava o acordo entre a escala natural do humano e a escala transcendental
do infinito.
As tentativas recentes de encontrar as formas adaptadas à
mentalidade moderna muitas vezes levaram a arquitetura a se afogar na paisagem
circunstancial e nas preocupações locais. Trata-se de uma arte religiosa
antropocêntrica, que exprime o homem com as suas emoções e a sua procura
estética de expressões e de formas. Essa arte esquece totalmente o desenho
originário dos grandes artistas e construtores, o próprio mistério do templo e a
arte sacra teocêntrica que exprime a descida de Deus na sua criação. É
perfeitamente legítimo procurar formas novas, mas isto deve exprimir um
conteúdo simbólico que permaneceu idêntico através de todas as épocas, porque a
sua origem é celeste. Os construtores modernos devem escutar e compreender as
sugestões do arquiteto supremo que é o Anjo do templo (Ap 21,15).
Desde o início, todos os templos cristãos deviam ter o
mesmo desenho que remonta à visão do Templo da Jerusalém celeste: por isso,
esta arquitetura fala a mesma linguagem. É o ensinamento profundo que vem do
ícone de Cristo “não feita pela mão do homem” (Il Santo Rosto). Todo ícone remonta
a este arquétipo traçado pelo Espírito Santo². É também o sentido da Tradição,
segundo a qual certos ícones foram realizados pelos anjos. Todavia, a origem
divina pressupõe uma receptividade ativa e doutra parte funda a existência de
uma norma canônica. Assim, o Concílio de 787 decreta: “A composição das imagens
não é deixada somente à iniciativa dos artistas”, essa deve obedecer às exigências
do Mistério litúrgico, ao advento de Deus que estabelece regras arquitetônicas
e iconográficas conforme a sua Presença.
De fato os santuários do Antigo Testamento foram edificados
segundo as indicações do próprio Deus: a arca da Aliança (Ex 36,34), o templo
de Moisés (EX 25,8-9) e aquele de Salomão são construídos segundo um “modelo
inspirado do Espírito” (1Cr 28,12.19), “que Tu preparastes desde a origem” (Sab
9,8; Ez 4,10-11). São Clemente de Roma precisa a tradição à qual se refere o
ritual da consagração do templo: “Deus mesmo escolheu o lugar onde se devem
celebrar os ofícios”³. A tradição é sublinhada por Eusébio na História
Eclesiástica, e mostra uma convergência entre a ideia judaica do
Templo-residência do Altíssimo e a ideia cristã da Nova Jerusalém do Reino de Deus. Segundo o Apocalipse de Baruc⁴, a Jerusalém celeste foi criada pelo
próprio Deus no Paraíso, portanto “in aeternum”.
¹ S. Germano, In Sanctae
Mariae zonam, PG 98, 384.
² “Todo ícone recebe a graça do Espírito Santo”, diz S.
JoãoDamasceno no seu Discorso sulle ícone,
PG 94, 300.
³ S. Clemente de Roma, Ad Cor. 1, 40.
⁴ Apocalisse di
Baruc, 2 IV, 3-7.
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